ela parecia um homem. cabelo bem curtinho, no estilo militar. sentou-se no banco azul da rodoviária enquanto esperava. ansiosa. pegou o maço de cigarros, caixinha. puxou aquele cilindro de nicotina e outra substâncias tóxicas. acendeu. deu uma tragada profunda.
aquela dose lhe acalmou os nervos. estava tensa antes. agora não mais. praguejou contra o faxineiro que tentava varrer o chão liso de lajotas. frio e reluzente sob luzes laterais. a vassoura correu entre as duas mochilas da mulher de cabelos curtos.
o faxineiro não respondeu, não deu atenção, às suas expressionistas reclamações. era tarde. fim de expediente. ele pensou na sobremesa de outrora, enquanto a mulher ficou ali curtindo seu cilindro de veneno. curtiu a brisa do cigarro de novo. parecia calma àquela hora.
ela olhou em direção da plataforma e observou a paisagem de um casal absorto. por um momento a menina alta do casal lhe pareceu familiar. olhou de novo. sentiu o andar da garota. reconheceu certa intimidade com aqueles quadris.
o casal desapareceu entre seres ansiosos para o embarque. e acompanhantes tristes, e relaxados pela sensação de dever cumprido. ela então olhou para o cigarro, que quase lhe queimava os dedos. as cinzas já prontas para irem ao chão. limpo pelo faxineiro.
foi quando respirou fundo, pensando no caminhar da garota. já haviam estado juntas. já tiveram oportunidade de trocarem mais que poucas e vazias palavras. seu ônibus havia chegado, afinal. deixou para trás as cinzas, sob o chão reluzente. bem encerado.
depois daquilo, daquele observar, tinha certeza que jamais voltaria a vê-la. sentiria saudades da garota. teria de viver com aquilo para sempre. cravado no coração navegante... fechou então seus olhos e pensou em nunca mais voltar.
por[emiliano cienfuegos]
início de outro dia do ano de 2007
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