29.11.06

gira a catraca

amanhã, dia 30 de novembro, sobe o preço do busão em são paulo. claro que evanderson não ficou sabendo disso pela diretoria da sua viação, a 'patronagem viação s.a.', que lhe pagava em dia. não era mesmo costume da empresa passar essas informações a seus motoristas e cobradores.

há quase 10 anos [10 anos incompletos, como costuma dizer] trabalhando nas principais linhas de ônibus na maior cidade brasileira. nenhuma vez foi instruído sobre o aumento das tarifas. desta vez, subirá de R$ 2 para R$ 2,30. quando acabou de ler a matéria em um dos jornais populares da cidade, evanderson começou a divagar.

"minha vida de cobrador vai virar um inferno. agora vou ter de ficar conferindo a maioria das passagens, o valor, contar aquelas moedinhas. um puta saco", ficou imaginando, na subida da avenida consolação, naquela tarde quente, daquelas que cozinham. a chuva caiu e levantou o mormaço. são paulo, uma panela de pressão.

se pelo menos aquelas moedas, os 30 centavos, fossem para o bolso dos cobradores e motoristas no final do ano. como uma ajuda de custo por todos os perrengues e encheções de saco que passam durante os 365 dias do ano. um prêmio por suportar os absurdos do trânsito. lidar com gente nas catracas também não é fácil.

o salário médio de um cobrador de ônibus em são paulo é de R$ 630. já de um motorista é um pouco mais, chega a R$ 1.150, pouco menos talvez. é pouco para enfrentar o pesado dia-a-dia das ruas de são paulo. a jornada diária para ganhar esse salário é de 7h10. se estourar esse tempo, o patrão paga hora-extra, dizem.

sem contar que os patrões não se importam em saber a opinião [diria conhecimento] dos cobradores e motoristas na hora de 'implementar a frota com ônibus modernos'. são ônibus que cada vez mais menos pessoas podem se sentar. idosos necessitam escalar altos degraus, que poderia ser descidos de rapel, de tão íngremes.

"colocaram portas logo depois da catraca, dos dois lados do ônibus. as pessoas acabam se amontoando ali na frente, do meu lado, por medo de não conseguir descer no ponto. nunca perguntaram onde seria melhor pôr uma porta. a gente reclama dos novos ônibus, mas não adianta nada. os patrões dizem que é coisa do projeto. não temos o que fazer."

"mas que descaso", argumentou o passageiro a evanderson quando ouviu a história. evanderson, aos 32 anos, olha para a catraca, libera mais um passageiro, e lamenta. Afinal, "os patrões não querem nem saber. o que interessa é mais dinheiro no bolso deles. a mim, me preocupa as tretas que vão surgir por causa desses 30 centavos."

um centavo para cada dia sofrido do mês... no bolso deles.

Um comentário:

Anônimo disse...

Textos como este que não seguem a risca do lead, pirâmide investida e graficos de "saiba como o cobrador agora irá dar o seu troco" é que eu gostaria de ver nos jornais. Muito mais vivo e real que uma página cheia de numerinhos, discursos de especialistas e personagens que estão ali só para atestar a matéria que já existe na cabeça dos editores. abraço